Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro assinam a releitura de ‘O Astro’. Trabalharam juntos em ‘JK’, minissérie de Maria Adelaide Amaral, e, a convite de Roberto Talma, formaram a dupla que mergulha na obra de Janete Clair com o desafio de recriar personagens contemporâneos mantendo os ícones usados pela autora na obra original.

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Alcides Nogueira é formado em Direito com pós-graduação em Genebra. Sonhava em ser diplomata, porém, o futuro lhe pregou uma peça. Em 1970, começou a trabalhar na Editora Abril, onde conheceu escritores como Maria Adelaide Amaral, Walther Negrão e Ignácio de Loyola Brandão. Depois de um tempo atuando como crítico teatral, começou a produzir seus próprios textos. Em 1981, estreou “Lua de Cetim”, peça pela qual recebeu o Prêmio Molière. O segundo Molière veio logo em seguida, em 1982, quando o escritor adaptou para o teatro o romance “Feliz Ano Velho”, de Marcelo Rubens Paiva. O reconhecimento como dramaturgo fez com que o diretor Paulo Ubiratan o convidasse para integrar a equipe de redatores de teledramaturgia da TV Globo. Seu primeiro trabalho foi no programa ‘Caso Verdade’, ainda em 1982. Desde então, Alcides esteve presente em telenovelas como ‘O Salvador da Pátria’, ‘Rainha da Sucata’, ‘Pátria Minha’, ‘A Próxima Vítima’, ‘Torre de Babel’, ‘Força de um Desejo’, ‘O amor está no Ar’, ‘Ciranda de Pedra’ e ‘JK’.

Geraldo Carneiro é poeta, letrista, roteirista de televisão, teatro e cinema. Ainda criança, conviveu com escritores e músicos que frequentavam sua casa, entre eles, Paulo Mendes Campos, Jacob do Bandolim e Tom Jobim. Desde os 16 anos, assinou letras de músicas que viriam a fazer sucesso nas vozes de Ney Matogrosso, Gal Costa e Vinicius de Moraes. Em 1970, iniciou uma parceria que se estenderia por 12 anos com o músico Egberto Gismonti. Foi parceiro também de Astor Piazolla, Wagner Tiso e Francis Hime. Publicou dez livros de poesia, entre os quais “Piquenique em Xanadu”, em 1988, prêmio Lei Sarney de melhor livro do ano. Na televisão, Geraldo estreou em 1983, como colaborador de Bráulio Pedroso na minissérie ‘Parabéns pra Você’, exibida pela TV Globo. A partir daí, fez parte de muitos projetos de séries da emissora, como ‘Terça Nobre’ e ‘As Cariocas’. Escreveu as séries ‘O Sorriso do Lagarto’ (em parceira com Walther Negrão), ‘Faça Sua História’ (com João Ubaldo Ribeiro), e foi autor e supervisor de texto do programa ‘Você Decide’.

Na época em que foi exibida a novela ‘O Astro’, vocês vivenciaram a comoção em torno da trama de Janete Clair. Como é, para vocês, hoje, entrar no mundo da dama da teledramaturgia e revisitar uma obra de tanta importância? Qual era a ligação de vocês com Janete, chegaram a conhecer e conviver com ela?

AN: Não conheci Janete pessoalmente. Foi uma pena, pois sempre tive grande admiração por ela. Acho que a única forma saudável de se revisitar a obra dela é não sacralizar Janete. Acho que nem ela gostaria que fosse assim. Janete sempre ousou. Então, ousemos por ela.

GC: Adorava a música de abertura, do João Bosco e Aldir Blanc. Também adorava o casal Dina Sfat e Francisco Cuoco, sobretudo quando ele usava o turbante, que lhe dava um ar dos filmes da minha infância. O assassinato de Salomão Hayalla, além de provocar comoção em todo o Brasil, quase virou assunto de segurança nacional, como se dizia naqueles tempos negros da ditadura militar. Que bom que a ditadura passou e o Astro reencarnou aqui. Não conheci pessoalmente Janete Clair, mas aprendi a admirá-la pela criatividade, o senso dramático e o despudor. Tomara que, por vias transversas, tenhamos a capacidade de aprender sua lição de lirismo e drama.

Geraldo já trabalhou muitas vezes com o diretor Roberto Talma. E você, Alcides, já trabalhou com diretor Mauro Mendonça Filho uma vez. Agora, os dois têm a possibilidade de trocar experiências. Com tem sido experimentar essas novas parcerias?

AN: Trabalhei com Mauro Mendonça Filho em ‘Força de um Desejo’, novela de Gilberto Braga e minha. Tenho um grande orgulho dessa obra. Maurinho é um homem culto, que conhece não só o universo da telinha, mas literatura, cinema, teatro (é ótimo diretor), música, artes plásticas… Há uma grande convergência de interesses. Quanto ao Talma, por incrível que pareça, com trinta anos de televisão, ainda não tinha participado de nenhum projeto com ele. E sentia muita falta disso, pois, pra mim, o Talma é um dos grandes nomes da nossa televisão. Não é só uma questão de experiência, mas de sensibilidade e inteligência. Ele é o pai deste projeto. Quando ele me convidou, fiquei imensamente feliz. Ainda mais para formar uma dupla com Geraldo Carneiro.

GC: Tive o privilégio e alegria de trabalhar com Roberto Talma umas cinquenta vezes. Mas ele sempre me surpreende pela criatividade e pela capacidade de compreender um texto. Espero que tenhamos outras cinquenta aventuras pela frente. Com Mauro Mendonça Filho só tive a sorte de trabalhar uma vez, mas como autor em uma adaptação de “A Megera Domada”, em parceria com Millôr Fernandes, há dez anos. E já nos primeiros encontros senti a harmonia entre todos nós. Sempre que temos que decidir algum ponto da minissérie é concerto, orquestrado e em sintonia.

Vocês dois já trabalharam juntos na minissérie ‘JK’ em parceria com Maria Adelaide Amaral. Mas é a primeira vez que trabalham em dupla. Como está sendo dividido o trabalho entres vocês e o que esperam dessa cumplicidade?

AN: Geraldo é um amigo do coração, e é muito difícil traduzir em palavras o que vivencio com ele neste trabalho. Somos cúmplices, companheiros, conspiradores! Há uma sintonia afinadíssima entre nós. Trocamos figurinhas o tempo todo. Geraldo me estimula, com sua inteligência, com sua poesia, com seu humor refinadíssimo. Somos felizes!

GC: Eu já admirava Alcides Nogueira desde que ele escreveu uma série de peças sobre Gertrude Stein e James Joyce. Assisti duas vezes à “Ópera Joyce”, mais de vinte anos atrás. Sem nenhum exagero, eu o considero um dos melhores dramaturgos que já li e assisti. Com as qualidades dramatúrgicas que tem, Alcides podia se dar ao luxo de ser um chato ou um pedante. Mas, como se não bastasse, é uma pessoa admirável pelo caráter, o refinamento e o senso de humor. Melhor, impossível.

Os personagens ganharam contemporaneidade nessa releitura. E o amor rasgado é um dos pilares. Como pretendem mostrar esse amor que parece estar tão longe do agitado cotidiano atual?

AN: Mostraremos o amor rasgado da maneira mais despudorada possível! O amor é livre, não tem amarras. O mundo anda feio, meio sem graça… o amor pode trazer mais alegria e emoção para os telespectadores.

GC: O amor é fundamental, na vida e na arte. Nossos personagens expressam essa necessidade central do amor. Quando não em suas falas, pelo menos em sonhos e pensamentos. De vez em quando, baixa um espírito de Petrarca, Dante, Noel Rosa ou Luiz Carlos da Vila em um de nossos heróis ou anti-heróis. Creio que Janete Clair aprovaria disso.

Na primeira versão, Lili e Neco moravam no Engenho Novo. Por que escolheram a Penha como subúrbio da minissérie ‘O Astro’?

AN: Pensamos na Penha por ser um bairro que está voltando a respirar. Com a retomada da região pelos moradores, a Penha volta a ser um lugar de paz e alegria como sempre foi. E, assim, queremos homenagear o bairro e sua história.

GC: História essa que muita gente pode desconhecer, mas a Penha já foi um bairro que ditava sucessos. Há alguns anos, a festa da Penha era frisson no Rio. Era ali que as músicas eram testadas. Se tinham aprovação, não dava outra: sucesso na cidade toda. Na Penha nasceu muito bamba, como Luiz Carlos da Vila, que muitos pensam ser de Vila Isabel, mas que na verdade é cria da Vila da Penha.

Qual é a sua principal motivação para ser autor de novelas?

AN: Saber que a minha criação está sendo compartilhada por milhões de pessoas. Não é pouco….

GC: O mais comum na minha vida é a poesia, que é só uma voz perdida no labirinto da solidão de cada um. Já um autor de novelas tem o dever de orquestrar muitas vozes. Tem que se dividir entre a extrema humildade de ouvir e reconhecer cada uma dessas vozes, e, ao mesmo tempo, brincar de ser o pequeno Deus que dá sentido à conjugação delas.

Por: Gardênia Vargas

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